- A Diretoria
- Presidentes
- Discursos de Posse
- Programação Cultural
- Galeria de fotos
- Galeria de Vídeos
Perfil do Ocupante(a)
Flávio Dino de Castro e Costa
- Cadeira:
- 32
-
Naturalidade:
- São Luis - MA
- Data de Nascimento:
- 30 de Abril de 1968
- Data da Eleição
- 21 de outubro de 2021
- Data da Posse
- 01 de dezembro de 2022
- Recepcionado(a) por:
- Ney Bello Filho
- Antecedido(a) por:
- Sálvio Dino
Senhor Presidente da Academia Maranhense de Letras, desembargador Lourival Serejo, e demais membros desta veneranda Casa de Cultura.
Exmo Governador Carlos Brandão, que me honra com sua fraterna presença,
Querido Presidente da Assembleia Legislativa do Maranhão, deputado Othelino Neto, na pessoa de quem cumprimento todos os demais parlamentares e líderes políticos.
Exmo Presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Paulo Velten, e, ao saudá-lo, abraço todos os queridos colegas da comunidade jurídica
Exmo. Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Reynaldo Soares da Fonseca que integra esta casa
Exmo Procurador-Geral de Justiça do Maranhão, Eduardo Jorge Hiluy Nicolau
Sr. Presidente do Tribunal de Contas do Estado, Conselheiro Washington Oliveira
Sr. Defensor Público-Geral, Gabriel Furtado
Confrade José Ewerton, Secretário-Adjunto da AML
Senhoras Secretárias e Senhores secretários de Estado,
Demais autoridades
Senhoras, senhores.
Pelos caminhos das ideias e dos afetos, recolhi amor, rosas, espadas e poesia, e com tal matéria-prima compus este discurso tão especial na minha vida.
Guimarães Rosa escreveu:
“Reze e trabalhe, fazendo de conta que esta vida é um dia de capina
com sol quente, que às vezes custa muito a passar, mas sempre passa.
E você ainda pode ter muito pedaço bom de alegria…”
(João Guimarães Rosa, A hora e a vez de Augusto Matraga, in: Sagarana,
31.
No transcorrer dos dias de capina que me cabem, trago no coração um enorme pedaço de alegria, nesta noite esplendorosa. E minhas mãos estão repletas de idênticos pedaços para entregar afetuosamente a todos que me honram com suas honrosas presenças e aos que nos acompanham pela internet.
Neste passo, inicialmente oferto palavras de gratidão. Gratidão ao Verbo, que se fez carne e habitou entre nós, como consigna o Evangelho de São João. Gratidão aos ilustres confrades e confreiras, que me honraram com suas fidúcias e generosidades, materializadas no voto. Gratidão especialmente aos amigos que me estimularam a enveredar por mais uma eleição, entre tantas de minha vida. Ney Bello é o companheiro de sonhos e conquistas de quase 5 décadas de convívio fraterno. Dos jogos infantis ao exercício de cargos públicos, sempre tive admiração por Ney, com sua intensa e fecunda inquietação – como se pode facilmente demonstrar com seus múltiplos êxitos, mormente no Direito e na Literatura. Felix Alberto, um dos laços existenciais atados na gloriosa UFMA, foi incansável na apresentação de minhas virtudes – reais ou imaginárias – aos dignos membros desta Casa. Dos mais antigos neste mundo, que já se encontram, com a graça de Deus, sob o pálio do Estatuto do Idoso, agradeço a Carlos Gaspar, que presidiu a minha eleição, e ao meu estimado padrinho Benedito Buzar.
Aludir a Buzar, amigo da vida inteira do meu saudoso pai e antecessor, me transporta para a Rua de Santana, onde ele também residiu, a algumas centenas de metros de onde agora estamos. A Rua de Santana foi o primeiro território dos meus encontros. Encontro com o colo da minha mãe, com as lições escolares da minha avó Dália, com a minha família, com amigos, com o Colégio Marista, com a minha amada São Luís. Mas entre tantos encontros um foi e é especial: o encontro com os livros. Fecho os olhos e sou capaz de sentir o cheiro da biblioteca do meu avô, desembargador Nicolau Dino, e a do meu pai, que ocupava quase metade dos escassos cômodos em que habitávamos. O meu amado antecessor, todos sabem, é uma das vítimas fatais da terrível pandemia que marca o nosso tempo para sempre. Do dia do nosso primeiro encontro marcado na minha memória de criança, até o derradeiro, meu pai tinha livros nas suas mãos. Ainda hoje, e para sempre, meus ouvidos ouvem a sua derradeira declamação de Gonçalves Dias, já no leito hospitalar:
“Não chores, meu filho;
Não chores, que a vida
É luta renhida: Viver é lutar.”
Assumir a cadeira 32 é uma honra. O meu antecessor, da infância às margens do majestoso Rio Grajaú, trouxe as primeiras letras e o gosto pelas coisas do mundo: futebol, diversões e namoros. Depois, na juventude em São Luís, descobriu a escrita literária, a política, a oratória. “O último guriatã de Atenas”, consoante o afetuoso e bem-humorado epíteto dado a Salvio Dino pelo seu compadre Buzar.
Foi orador oficial do Centro Acadêmico Clodomir Cardoso e, desta então destacada tribuna acadêmica, logo passou à consagração pelo bálsamo do voto popular, sendo eleito vereador de São Luís, aos 22 anos, em 1954. Na sequência de sua caminhada existencial, Salvio Dino, juntamente com seu compadre Benedito Buzar, chegou à Assembleia Legislativa. O destino lhe parecia traçado linearmente, sempre cada dia mais resplandecente. Então, entra em cena a peripécia, “a mudança dos acontecimentos para o seu reverso”, na dicção de Aristóteles.
Com efeito, a terrível noite da ditadura, que encobriu a nossa Pátria em 1964, cassou arbitrariamente o seu mandato parlamentar, quando Salvio Dino estava no verdor dos 32 anos. Brutal e dolorosa injustiça, contra a qual ele protestou na tribuna da Assembleia, em discurso gravado nos Anais daquela Casa:
“Senhor Presidente, neste instante em que está sendo cassado o meu mandato, em que perco os meus direitos de representante do povo, em que sou degolado politicamente, afirmo, com toda a sinceridade que me vai n´alma, que serenamente aguardarei o julgamento da História.”
De fato, o julgamento veio de múltiplas formas, uma delas é que sobre os algozes caiu o manto do esquecimento, enquanto o “politicamente degolado” hoje é celebrado, e continuará a ser por décadas e séculos, enquanto existir a Cadeira 32 nesta imortal Academia.
Uma década depois, Salvio Dino retomou a atividade política. Em seguida, estreou no mundo das publicações literárias, com “Nas Barrancas do Tocantins”, livro de contos sobre o qual disse um dos nossos maiores luminares, Josué Montello, em artigo intitulado “Literatura e Política”:
“Sálvio Dino deu a urdidura do
conto às suas experiências políticas, aquilo que viu e observou com
as suas vivências de deputado, andando sertão adentro, ou litoral a fora, no seu
duro trabalho de auscultador do
povo. Em vez de viver apenas a
luta política, fez dessa luta – com
as impressões que recolheu – a própria substância da criação literária, numa forma clara, direta e
harmoniosa, que lhe confirma a
vocação das letras. E se livro desse
direito a voto, aqui teria ele o meu,
com aplauso.”
Para realçar o que o Mestre Josué enunciou, trago a lume um trecho do conto Mané Cicero, constante da obra “Nas Barrancas do Tocantins”:
“O velho homem do campo repete toda
a sua via-crucis. A
seca do Ceará. A busca das terras verdes no Maranhão. A luta contra a mata bruta. O impaludismo tenebroso. A criançada morrendo de fome. As levas de retirantes chegando no Mearim. A viagem para o desconhecido Tocantins. O duro trabalho no cultivo da terra. O vento da felicidade, soprando no roçado verdejante. A tempestade da desgraça, surgindo com a chegada dos grileiros. A ameaça de despejo na marra. A humilhação na porta do doutor juiz de Direito.”
Facilmente se identifica uma das mais fortes referências literárias de meu predecessor: o regionalismo da prosa nordestina, focada na realidade nacional, pondo em primeiro plano o sofrimento do povo do Nordeste e incorporando termos regionais. Em “Nas Barrancas do Tocantins”, em vários contos essa filiação buscada por Sálvio Dino fica bem evidenciada, denunciando uma sociedade com as clivagens e injustiças derivadas do coronelismo, em que – mais do que a natureza hostil – falam mais alto os problemas sociais e políticos.
Salvio Dino é autor de muitas outras obras, entre as quais exemplifico:
* Um Moço na Tribuna (1959)
* Raízes históricas de Grajaú (1974)
* Semeando manhãs (1985)
* Luzia, quase uma lenda de amor (1990)
* Onde é Pará, onde é Maranhão? (1990)
* A Faculdade de Direito do Maranhão (1996)
* Clarindo Santiago: o poeta maranhense desaparecido no rio Tocantins (1997)
* Leões: um palácio de histórias, lenda, mitos & chefões (1997)
* A Coluna Prestes a Exilar-se – passagem pelo sul-maranhense (2016)
Para completar esse painel sobre vida e obra do meu estimado predecessor, julgo essencial destacar o seu pioneirismo, ainda na década de 70, ao cuidar da temática ambiental. Lembro, a esse propósito, a autoria da lei que impõe a preservação da árvore-símbolo do Maranhão: a palmeira de babaçu, a imagem-síntese das muitas belezas naturais gonçalvinas. Sim, a nossa “terra tem palmeiras”, com tantos belos cantos.
Ponho sob holofote a seara ambiental por considera-la uma das mais relevantes do nosso tempo, e sobre a qual escrevi um dos livros que me credenciaram a esta Augusta Casa. Em parceria com meu irmão Nicolao Dino e com o confrade Ney Bello, dedicamo-nos a mostrar a importância da máxima efetividade à generosa e qualificada legislação ambiental brasileira. Vivemos, em dias recentes, a 27ª edição da Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP 27, realizada no Egito, marcando a retomada do protagonismo da nossa Pátria nesse debate mundial. Destarte, somos e devemos sempre ser um dos maiores prestadores de serviços ambientais e ecossistêmicos ao planeta, provendo segurança climática à atual e às futuras gerações.
Falar de meio ambiente me atrai às águas do Rio Itapecuru, que batizam a Cadeira 32, na medida em que, além do nosso patrono Vespasiano, essa bacia hidrográfica abençoou Mariana Luz, nascida em Itapecuru-Mirim; Félix Aires, nascido em Buriti Bravo; e Raymundo Carvalho Guimarães, vindo ao mundo em Passagem Franca. Todas as cidades mencionadas, mais a Caxias de Vespasiano, pertencem à bacia hidrográfica do Itapecuru.
“Navegar é necessário”, proclamou o general romano Pompeu e reverberaram – ainda que com outros sentidos – os poetas Petrarca, Fernando Pessoa e Caetano Veloso. Lancemo-nos, pois, a esta missão náutica pelo Itapecuru e seus afluentes literários, no caso o patrono da noite e os meus insignes antecessores.
O patrono Vespasiano Ramos. Um trabalhador do comércio de Caxias que se fez poeta e andarilho por muitas veredas brasileiras, especialmente da nossa Amazônia.
Foi, acima de tudo, um poeta do amor, filiado ao romantismo das paixões impossíveis e das musas inatingíveis.
Ainda não havia o WhatsApp e nem a fórmula mágica “E aí, sumida ?” , que já conduziu a tantas uniões felizes, de instantes ou de anos.
Em tempos quiçá mais compatíveis com a inesgotável sede humana por amor, o caxiense Gonçalves Dias cantou:
“Enfim te vejo! – enfim posso,
Curvado a teus pés, dizer-te
Que não cessei de querer-te,
Pesar de quanto sofri.”
E Vespasiano, com o coração dominado por Lili Bitencourt, na mesma toada:
“De joelhos, caindo, as mãos estendo
Ao vosso amado coração em flor;
Como serei ditoso recebendo
Uma esmola de amor.”
Num caso e noutro, bem sabemos o final da história, compatível com o espírito do tempo, que Vespasiano pintou e eternizou em Sulamita, do qual leio a parte final:
“Procuro te esquecer;
Procuro te esquecer, um só momento,
Mas, ah! como te dar o esquecimento,
Sem deixares de ser,
Sem deixares de ser meu pensamento!
Soluça, alma perdida!
Soluça, como nunca soluçaste:
A dor que sentes nunca mais se finda!
Visão radiosa que encontrei na vida:
Desgraçada a paixão que me inspiraste,
Desgraçado de mim que te amo ainda!”
Vespasiano, “o lirismo feito homem” consoante a definição de Humberto de Campos, desprezado pela mulher idealizada, ilumina uma das vertentes mais fecundas do Romantismo: os sofrimentos e reveses transformados em versos de conforto e refúgio.
Mariana Luz, a poeta das rosas. Uma mulher dedicada à educação e à cultura. Cultivava rosas coloridas em seu jardim; rosas esperançosas no coração dos estudantes, sobretudo os mais pobres; e rosas tristes nos seus poemas.
Com efeito, Mariana Luz imprimiu, de modo predominante, as marcas da dor, do desespero, do desencanto, à sua produção literária. Escutemos a sua voz:
“Como pálido espectro, vacilando
A cada passo sobre a laje fria,
Eu vou seguindo a dolorosa via
Onde pedaços da alma vou deixando.
E esse viver atroz que, dia a dia,
Meu pobre coração vai torturando
Torna-me um ser tristonho e miserando
Engolfado em letal melancolia.
Exausta caminheira, chego ao termo,
Do sofrimento;
o coração enfermo,
Já não sinto pulsar… pobre esquecido…
É inútil tentar. Ao longe, esguio
Vejo um cipreste lúgubre, sombrio, Morrer! … E vou morrer sem ter vivido!”
Em um singular paradoxo, creio ser possível situar Mariana Luz em meio ao penumbrismo que, segundo Norma Goldstein “se caracteriza por uma melancolia agridoce, pelos temas ligados ao quotidiano, por uma morbidez velada.”
Devemos a Jucey Santana, ilustre integrante da Academia Itapecuruense de Ciências, Letras e Artes, a publicação do livro “Marianna Luz – Vida e Obra”, leitura imprescindível para a compreensão da relevância de Mariana naquela cidade e nesta Academia Maranhense.
Felix Aires. O poeta de múltiplas formas, que transitou do parnasianismo ao modernismo, como revela o conhecimento de sua vasta produção literária. Esta impressiona pelo abundante repertório vocabular, do qual lança mão para compor poemas luminosos. Deste conjunto, destaco os instigantes versos em miniatura:
Terra Natal
Mar
Solto
Re
Volto !
Democracia
Bela,
Livre,
Ela
Vive !
Portinari
Clara
mente
para
frente !
Finalmente, Carvalho Guimarães. O dedicado servidor público que transcendeu a aridez das rotinas burocráticas. Preocupado com as coisas da cultura, integrou Academias e Institutos de prestígio, no Maranhão e em outros Estados. José Chagas, figura exponencial na vasta galeria desta Casa, ao receber Carvalho Guimarães acentuou:
“Quando o conheci mais profundamente, fiquei admirado de ver
como esse homem, de múltiplas e variadas atividades, (…) tinha tempo para discorrer sobre literatura e interessar-se
de modo tão vivo pelos trabalhos literários da terra.”
Senhoras, Senhores ! Estes são os homens e mulheres que deram vida e rosto à cadeira 32, que agora com genuína honra passo a ocupar. E, em hora tão solene, sinto o sabor da imortalidade.
Sim, somos imortais. Imortais porque do pó viemos e para ele retornaremos, no vir-a-ser para o Reino de Deus.
Sim, somos imortais porque assim são os valores que nos comprometemos a profetizar: o culto à ciência, às letras, à arte.
Sim, somos imortais porque, em vez de escravos dos algoritmos da internet, somos humanos, sempre com fome de pão, de beleza e de conviver – e, convivendo, vivemos para além de nós mesmos. O que é mais eterno do que o amor, em suas múltiplas e tão sublimes formas, como o amor de um pai ou mãe pelos seus filhos ? Ao amar, somos imortais, e por isso agradeço à minha amada Penélope, que se chama Daniela – esteio macio (às vezes áspero, mas sempre com razão) no qual me sustento em tão sinuosas aventuras. E meu carinho imortal aos amores maiores, os filhos que o Pai me confiou: Vinicius, Marcelo (que vive e viaja em cada gota do meu sangue), Artur e Davi. Por eles, tento me fazer herói, até de capa e espada se necessário for.
Minhas palavras, nascidas do coração, também são de homenagem a esta Academia. Somos vários, somos um. O Um-Multiplo de que nos fala Platão, ao ensinar que uma Forma é uma totalidade que abarca particularidades.
Somos, em totalidade e nas particularidades, sempre contraditórios, cindidos, incompletos, como assentado por um dos gênios maiores do Maranhão, Ferreira Gullar, em TRADUZIR-SE:
“Uma parte de mim
é todo mundo;
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.
Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão
Uma parte de mim
pesa, pondera;
outra parte
delira.”
E arremata:
“Traduzir-se uma parte
na outra parte
— que é uma questão
de vida ou morte —
será arte?”
Confrades, confreiras !
O Visconde Partido ao Meio, magnífica construção literária de Ítalo Calvino, diz muito sobre a matéria humana, sobre cada um de nós, sobre o nosso tempo, sobre o Brasil de hoje.
O que teria sido o “tiro de canhão” que, antes de partir o Visconde em metades, instigou Calvino na sua fábula ? A bomba de Hiroshima ? O ambiente da Guerra Fria, após a terrível 2ª Grande Guerra ? Ou o simples viver para além da juventude ? O fato é que cada um tem no seu próprio peito o “tiro de canhão” que lhe coube e cabe. Antes dele [do tiro], “as coisas ainda eram inteiras e indiscutíveis, e assim era ele próprio,” diz o narrador da obra de Calvino, falando sobre o Visconde. E falando sobre todos nós.
Na nossa época, somos ainda mais fragmentados, porém – ao mesmo tempo – permanecemos convidados, em nossa caminhada existencial, a costurarmos os nossos fragmentos e estabelecermos a unidade possível, mesmo que precária, instável. Com o Visconde, tal impulso emergiu do amor por Pamèla, conducente a um duelo de espadas entre as suas duas metades, uma boa e a outra má.
No duelo, as espadas atingem as duas partes do Visconde, fazem ambas sangrarem, então a ciência médica as une. E o narrador assenta: “Assim, meu tio Medardo voltou a ser um homem inteiro, nem mau nem bom, uma mistura de maldade e bondade, isto é, aparentemente igual ao que era antes de se partir ao meio. Mas tinha a experiência de uma e de outra metade refundidas, por isso devia ser bem sábio.”
Os dignos integrantes desta Casa escolheram as artes e humanidades como os fios que costuram suas próprias inevitáveis cisões existenciais. E, ainda mais, resolveram integrar-se nesta assembleia para estender tais fios para além das fronteiras deste edifício. Com idêntico espírito de serviço, apresento-me e, com muita honra e alegria, alisto-me para aprender com meus confrades e confreiras. E, assim, continuar o que mais importa: servir, com amor e autêntico espírito cívico, ao povo do Maranhão.
Em SEIS PROPOSTAS PARA O PRÓXIMO MILÊNIO, Ítalo Calvino aborda características que considera essenciais para a qualificação de obras literárias. Publicado no Brasil em 1990, o texto – também conhecido como Lições Americanas – chega vigoroso à 3ª década do século 21. No mundo de O VISCONDE PARTIDO AO MEIO estão contidas seis propostas que Calvino valoriza no texto literário: leveza, exatidão, visibilidade, rapidez e multiplicidade. E também consistência, tema da conferência não escrita, impedida pela morte do autor.
Repiso as propostas fundamentais de Ítalo Calvino: leveza, exatidão, visibilidade, rapidez, multiplicidade, consistência. Foi o que procurei imprimir nesta tão luminosa noite.
Concluo com a instigação que emerge da multicitada obra “O Visconde Partido ao Meio”: “Talvez se esperasse que, uma vez inteiro o visconde, se abrisse um período de felicidade maravilhosa; mas é claro que não basta um visconde completo para que o mundo inteiro se torne completo.”
Senhoras, senhores. O mundo completo, bom, belo e justo é o que nos cabe buscar. Afinal, não há vida sem utopias, sem transcendência. Pois sigamos nossos dias de capina e sol, com poesia, rosas e espadas !
Muito obrigado.